Jornal Correio da Paraíba

Domingo, 3 de fevereiro de 2008
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Degradação castiga Picãozinho

Copos descartáveis, papéis, latas de cerveja, pontas de cigarro e diversos outros tipos de dejetos são apenas alguns dos objetos que ‘visitantes’ desrespeitosos deixam em locais como a orla marítima da Capital e em áreas de preservação que são abertas à visitação, como Picãozinho. Mesmo com uma limpeza permanente, o acréscimo de lixo em toda a cidade é de 30%, segundo a Autarquia Especial Municipal de Limpeza Urbana (Emlur), durante o verão. Além disso, devido à crescente degradação, técnicos do Ibama consideram a possibilidade de limitar ou de proibir a visita a Picãozinho se os danos causados pelo homem não diminuírem.

O biólogo do Ibama, Ronilson Paz, disse que entre os vários problemas que agridem consideravelmente o ecossistema daquele lugar, o lixo e a visita não consciente são os maiores perigos. “Não gostaríamos de ser alarmistas, mas se a visitação dos corais de Picãozinho não for controlada, se os barcos não deixarem de jogar suas âncoras sobre os corais, do mesmo modo que aconteceu em Maragogi (na divisa de Pernambuco com Alagoas), o Ibama não terá outra alternativa, visando principalmente à proteção deste ambiente tão frágil”, disse.

Picãozinho é um roteiro quase que obrigatório de turistas que visitam a Capital devido a beleza dos seres que habitam o lugar, além da tranqüilidade das piscinas naturais. Há pouco mais de um quilômetro da costa de Tambaú, os arrecifes de corais e os milhares de peixes coloridos também encantam, ao mesmo tempo que sofrem com os inúmeros danos.

Entre as principais atitudes destacadas pelos biólogos como mais agressivas a Picãozinho estão de pisoteio e lançamento de âncoras nos corais, o fornecimento de alimentação aos peixes, excesso de barcos que atracam nos corais e lançamento de detritos no mar. “De todas as agressões que podem ser cometidas a ambientes recifais, a mais deletéria é o fundeio das embarcações nos corais, porque destrói e provoca a perda de tecido, podendo levar a morte do organismo”, disse o biólogo do Ibama.
Ele lembrou ainda que todo esse conjunto de condutas degradantes pode provocar um dano tão sério que o frágil equilíbrio encontrado em um ambiente como este pode ser perdido.

Disciplinamento de barcos
Para tentar coibir a degradação, o biólogo do Ibama disse que já houve várias reuniões com representantes de empresas operadores de turismo de João Pessoa, como a Associação dos Proprietários de Embarcações de Turismo de João Pessoa – Apetep, Colônias de Pescadores, Capitania dos Portos, Secretaria de Meio Ambiente (Semam), Secretaria de Turismo (Setur), PBTur, Associação Paraibana dos Amigos das Natureza (APAN), a fim de discutir soluções para esses problemas levantados.

“Nestas reuniões, ficou acordado a elaboração de um cronograma de visitação aos recifes de Picãozinho, com o intuito de coibir os exageros por acaso observados, a elaboração de um projeto de balizamento e disciplinamento dos barcos na área de Picãozinho e uma análise do impacto da visitação sobre o ambiente recifal de Picãozinho”, contou.

Cada uma dessas ‘tarefas’ será, segundo ele, a cargo de um órgão diferente. Ele disse ainda que, por parte do Ibama, com apoio da Capitania dos Portos, campanhas de conscientização com os operadores dos catamarãs que exploram a visitação de Picãozinho e demais pessoas interessadas estão sendo feitas, bem como uma fiscalização para coibir os abusos.

Os corais, ou recife de corais, constituem colônias que crescem nos mares e podem formar recifes de grandes dimensões que abrigam um ecossistema com uma biodiversidade e produtividade extraordinárias. Além disso, explica o biólogo, os ambientes recifais fornecem uma variedade de bens e serviços à humanidade, como a proteção do litoral contra a ação das ondas (formando verdadeiro quebra-mar), produção de alimentos para as comunidades costeiras, formam berçários para espécies marinhas, bem como os benefícios provenientes do uso recreativo e turístico.

Unidade de conservação
Uma Unidade de Conservação abrangendo os arrecifes de corais do litoral da Paraíba pode ser fundada se todos os estudos que já estão sendo feitos, para analisar a viabilidade do projeto forem realizados com êxito. Entre eles, está o ‘Turismo Sustentável como Alternativa de Desenvolvimento e Conservação do Meio Ambiente em Picãozinho’ coordenado pela Professora Cristina Crispim, do Departamento de Sistemática e Ecologia, da Universidade Federal da Paraíba.

Este projeto foi uma solicitação da Secretaria Executiva de Turismo de João Pessoa (Setur), mas, para que a criação da Unidade de Conservação escolhida pelos interessados no ambiente de Picãozinho seja concretizado, ainda serão necessários estudos sócio-ambientais, além de audiência pública, para se ter certeza que os atores sociais que utilizam desse ecossistema seja consultados.

O biólogo Ronilson Paz disse ainda que com o sem a criação de Unidade de Conservação abrangendo o ambiente recifal de Picãozinho, o Ibama envidará esforços no sentido coibir os exageros. “Picãozinho trata-se de um importante ambiente marinho, considerando que ele é um patrimônio da União, e serão adotadas as seguintes medidas: ordenação de mergulho e pesca, fiscalizados os métodos de ancoragens, estabelecidos planos de zoneamento, bem como controle de visitação e de visitantes”, garantiu.

A principal estratégia proposta para a conservação e uso sustentável dos recifes seria a criação de áreas marinhas legalmente protegidas, no caso unidades de conservação.

“De acordo com a vocação do ambiente recifal de Picãozinho, pessoalmente vislumbro a possibilidade da criação de uma de três categorias de Unidades de Uso Sustentável: uma Área de Proteção Ambiental – APA, esta abrangendo não somente Picãozinho, mas toda a zona recifal da costa da Paraíba, como idealizada recentemente pela Superintendência de Administração do Meio Ambiente – Sudema, que consistia na ampliação do Parque Estadual Marinho de Areia Vermelha e a mudança de sua categoria. Esta proposta, infelizmente não sabemos o porquê foi abandonada pela Sudema”, lamentou.

Até 1998, conta o biólogo, visitavam Picãozinho apenas os pescadores para realizar passeio com a família, pesca artesanal e limpeza dos barcos e dos motores. Foi no final dos anos 80 que Picãozinho foi descoberto como fonte de recursos econômicos.

Diovanne Filho

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O degelo na Antártida aumentou 75% nos últimos 10 anos e é quase tão grande como o observado na Groenlândia, revelou na quarta-feira (23), um estudo realizado por cientistas de universidades e da Nasa.

Os pesquisadores do Laboratório de Propulsão a Jato (JPL) e da Universidade da Califórnia detectaram um aumento da perda de gelo cuja magnitude foi suficiente para aumentar o nível dos oceanos de 0,3 milímetro por ano, em 1996, para 0,5 milímetro, em 2006.

Segundo Eric Rignot, cientista do JPL, a perda de gelo concentrou-se na região de Pine Island, na Antártida Ocidental, e no extremo norte da Península Antártica. Esses degelos foram causados por uma aceleração no fluxo das geleiras em direção ao mar. Rignot acrescentou que o avanço mais rápido das massas de gelo deve-se ao aumento das temperaturas do mar.

“As mudanças no fluxo das geleiras está provocando um grande impacto, embora não dominante no equilíbrio da massa de gelo antártico”, assinalou o cientista. As conclusões do estudo foram extraídas de dados fornecidos durante 15 anos pelos satélites da Nasa, da Europa, do Canadá e do Japão.

Segundo Rignot, a maior contribuição da Antártida ao aumento do nível do mar indica a necessidade de uma observação mais próxima do fenômeno.

“Estes novos resultados ilustram a vital importância de continuar observando a Antártida para determinar a forma como esta tendência seguirá”, assinalou.

O cientista indicou que ainda se sabe muito pouco sobre a futura contribuição da Antártida a esses níveis. “As plataformas de gelo estão respondendo mais rápido ao aquecimento climático do que o esperado”, indicou.

Além do JPL e da Universidade da Califórnia, participaram da pesquisa o Centro de Estudos Científicos de Valdivia (Chile), a Universidade de Bristol (Reino Unido), o Instituto de Pesquisa Marítima e Atmosférica da Universidade de Utrecht, o Instituto Meteorológico Real (Países Baixos) e a Universidade do Missouri (Estados Unidos). (Estadão Online)

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I – O Rio

1 – É verdade que o Rio São Francisco está morrendo?

Não. O Rio São Francisco ainda é um rio muito saudável e pujante. Ele tem sido muito ameaçado pelos impactos da ação do homem, de que são exemplos a poluição por esgotos, as barragens construídas ao longo do seu leito para a geração de energia elétrica, o assoreamento causado pelo desmatamento crescente dos cerrados em benefício da agropecuária, e a agressão às suas matas ciliares. Apesar disto, o rio segue resistindo bravamente. Ele é e será uma fonte de sustentação econômica para os habitantes de sua bacia hidrográfica, porque continua a receber, na média, a mesma quantidade de chuva de antes, mantendo, sem alteração, há mais de duas décadas, o suprimento de energia elétrica ao Nordeste, beneficiando por igual todos os Estados da região. A quantidade de suas águas não está comprometida e o São Francisco está em melhor situação qualitativa do que muitos rios do Sudeste. Portanto, o rio não está morrendo.

2 – Mas o Velho Chico tem problemas?

Sim, o Velho Chico precisa ser mais bem cuidado, principalmente nos afluentes mais degradados pela ação humana, como tantos outros rios do país. Em alguns trechos, a derrubada das matas, que cobriam suas margens e encostas, provocou o assoreamento do leito do rio, que é a formação anormal de bancos de areia, o que prejudica a navegação e o habitat dos peixes. Em outros lugares, a falta de tratamento de esgoto das cidades ribeirinhas provocou a poluição das águas. De fato, é preciso cuidar melhor do Rio São Francisco.

3 – O rio precisa ser revitalizado?

Sim, e isso já está acontecendo. A revitalização hidroambiental da bacia do São Francisco é um programa coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente, com a participação do Ministério da Integração Nacional e da sociedade sanfranciscana. O programa de revitalização do São Francisco contempla ações voltadas para o reflorestamento de áreas críticas, a construção de barragens em rios afluentes, a melhoria da calha navegável do seu curso médio, o tratamento de esgotos das cidades e vilas localizadas nas suas margens, o controle da irrigação e a educação ambiental. Há também ações para a melhoria das condições de vida das comunidades ribeirinhas. O Governo Federal investiu, em 2004, R$ 26 milhões nessas ações de revitalização do rio. Em 2005, esses investimentos para a revitalização do rio serão de R$ 100 milhões, só na área dos Ministérios da Integração Nacional e do Meio Ambiente. Há outros recursos: desde 1988, a Chesf repassa, diretamente para os Estados e os municípios da Bacia do São Francisco, 6% do seu faturamento bruto, o equivalente a R$ 90 milhões por ano. É um dinheiro que, segundo a Lei, deve ser obrigatoriamente aplicado em ações de revitalização do rio. De 1988 até agora, a Chesf já repassou R$ 1,350 bilhão para os municípios sanfranciscanos. O Ministério das Cidades, por sua vez, está aplicando R$ 620 milhões em projetos de saneamento básico e/ou de abastecimento d’água em 86 municípios da Bacia. A degradação do rio, que já dura mais de 100 anos, não é uma ação de curto prazo e nem é responsabilidade somente do Governo Federal, mas também dos governos estaduais e municipais, que devem trabalhar juntos para o enfrentamento do problema.

4 – É verdade que o Rio São Francisco vai ser desviado?

Absolutamente não. Não é nada disso. O Velho Chico vai continuar no mesmo curso que sempre teve. Só uma pequena parte do seu volume – ou seja, apenas 1% da água que ele joga no mar – vai ser captada para garantir o consumo humano e animal na região do semi-árido nordestino, onde vivem 12 milhões de pessoas. Não haverá nenhum problema ambiental para o São Francisco ou para qualquer atividade econômica que hoje se desenvolve ao longo de seus 2.700 km de extensão. A quantidade de água a ser retirada é, realmente, muito pequena.

5 – Ainda assim, a retirada de água para perenizar outros rios não é prejudicial ao Rio São Francisco?

Não, por várias razões. Em primeiro lugar, há disponibilidade de água no Rio São Francisco para utilização no desenvolvimento do Polígono das Secas, assim como se tem feito com a sua energia hidrelétrica. Em segundo lugar, e é importante que se repita isto, a quantidade de água a ser retirada é muito pequena. A terceira razão é que essa captação vai ocorrer apenas em dois pontos e em locais onde a vazão do rio já está regularizada pelas barragens, não afetando as atividades econômicas nem a navegação. A quarta razão, é que a água a ser retirada vai ser usada principalmente para o consumo humano, para matar a sede de milhões de nordestinos que habitam o Polígono das Secas. Tudo isso será feito sem prejudicar o Rio São Francisco e em clima de concórdia, pois cabe ao Governo Federal zelar pela distribuição das oportunidades de desenvolvimento entre os irmãos brasileiros.

6 – Os usuários do São Francisco terão prejuízos?

Não, porque o curso do rio não será alterado e muito menos serão afetadas as condições hídricas e ambientais. Com esse projeto, vai acontecer o mesmo que já acontece em centenas de outros pontos do rio: haverá captação de água para abastecimento humano. O que muda é a quantidade de água, um pouco maior do que é captado em cidades de médio porte. Mas, ainda assim, a quantidade de água a ser retirada equivale a somente um por cento do que o rio joga no mar. Além disso, há milhões de pessoas vivendo no semi-árido com muito pouca água. Quando chega a seca, muitos não têm água nem para beber. Seria desumano ignorar essa situação dramática que aflige o Nordeste há séculos.


II – A Migração

1 – Então, é uma questão de solidariedade humana?

É, sim. A pequena quantidade de água que será captada do Rio São Francisco não causará qualquer prejuízo aos seus usuários, mas terá importância vital para milhões de nordestinos que, com suas famílias, vivem na parte mais seca do Nordeste. A vida dessas pessoas, certamente, melhorará. Vale lembrar que a seca não só maltrata as pessoas e os animais, como também dilacera as famílias, por causa da migração forçada. Os mais jovens e mais fortes vão para outras regiões, procurar emprego para garantir a sua sobrevivência e dos seus parentes. Ficam no sertão as mulheres, as crianças e os velhos, muitos deles tão doentes e fracos que não têm como garantir comida e água até que chegue a ajuda dos que foram embora, empurrados pela seca. Alguns dos que migram não voltam mais, nem mandam notícias e suas famílias ficam destroçadas para sempre. Outros mandam buscar os parentes e vão morar em favelas na periferia das grandes cidades, com problemas diferentes (violência, desemprego, más condições de moradia, fome etc.), porém até mais graves do que os que enfrentavam no sertão nordestino.

2 – A migração por causa da seca é tão dramática assim?

É um drama pessoal e familiar que atinge centenas de milhares de nordestinos, principalmente. A migração forçada também causa sérios problemas para o governo federal, os governos estaduais e as prefeituras das grandes cidades, como o inchaço das regiões metropolitanas, a proliferação de favelas, o déficit de moradias, a insuficiência da infra-estrutura básica (transporte coletivo, saneamento, abastecimento de água, rede elétrica, escolas e hospitais), o desemprego e o aumento da criminalidade. Ou seja, a falta de água no semi-árido afeta não só quem está lá: acaba prejudicando até quem nunca passou pelo sertão nordestino.

3 – Há quanto tempo ocorre a migração por causa da seca?

Há pelo menos 150 anos. A migração do Nordeste em direção a outras regiões do país é um movimento populacional constante e antigo, dos mais importantes no mundo moderno. Também é volumoso, atingindo o auge nas secas prolongadas. Dezenas de milhões de nordestinos fugiram da seca em direção ao Norte, ao litoral, ao Centro Oeste e ao Sudeste. Pelo menos um terço dos habitantes da Grande São Paulo é composto por nordestinos ou descendentes de retirantes da região. Até o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, foi obrigado a sair de sua terra natal com parte da família, migrando para São Paulo. Em resumo, a falta de água no semi-árido dificulta a criação de empregos e a sustentação de suas populações.

4 – É possível impedir a migração para as grandes cidades?

Num país democrático, as pessoas têm o direito de ir e vir para onde e quando quiserem. O que tem que ser combatida é a causa da migração forçada, que é a falta de condições de vida digna no semi-árido por escassez de água. Havendo água, as famílias vão continuar unidas na sua terra natal, porque estará garantido o que beber e o que comer e haverá atividade econômica, com renda e empregos. Esse é o objetivo do projeto de integração da bacia do Rio São Francisco com as bacias dos rios intermitentes do chamado Nordeste Setentrional, que envolve o agreste e os sertões de Pernambuco, da Paraíba, do Rio Grande do Norte e do Ceará. A água vai permitir o desenvolvimento sustentável naquela região e só quem quiser vai precisar ganhar a vida em outros lugares.


III – O desenvolvimento do semi-árido

1 – O que impediu, até agora, o desenvolvimento econômico do semi-árido?

Foi principalmente a escassez de água, seja das chuvas, dos rios ou de outras fontes. E sem abastecimento assegurado de água, nada vai mudar no semi-árido nordestino. O desenvolvimento de grande parte da região Nordeste está comprometido pela escassez de água nas bacias dos rios intermitentes, o que leva a uma condição crítica de vida humana. O Ceará, o Rio Grande do Norte e a Paraíba não dispõem de uma fonte permanente de água, isto é, eles não têm rios perenes, como é o São Francisco, que beneficia Minas Gerais, Bahia, Sergipe, Alagoas e Pernambuco, e como é o Parnaíba, que beneficia o Piauí. Assim, o sertanejo fica à espera de uma chuva que por vezes vem, permitindo-lhe garantir comida e renda precária em alguns anos, mas nunca em quantidade suficiente para garantir reservas para os anos secos. É um jogo de loteria com a natureza, que raramente permite capitalizar o pequeno produtor, melhorar sua tecnologia e viabilizar a saída da indigência. A pobreza rural perpetua-se, aumenta a dependência dos políticos e gera contínua migração. É, ainda, uma das chagas expostas do Brasil.

2 – Mas é legal tirar água de um rio para colocar em outro?

A Lei de Recursos Hídricos (9.433/97) determina que o Estado deve garantir a necessária disponibilidade de água para a população, onde ela reside. Além disso, a gestão dos recursos hídricos, embora realizada por bacias hidrográficas isoladas, não determina os direitos de quem pode ter acesso à água, especialmente nos rios federais, cuja água pertence à toda sociedade brasileira. O governo entende que a integração da bacia do São Francisco às do Nordeste Setentrional é essencial para promover a igualdade de oportunidades para todos os brasileiros, evitando que uns sejam prejudicados, sem necessariamente beneficiar os outros, pois existirá água para todos, ainda durante muitas décadas, sem a necessidade de trazer água de rios de outras regiões para o Nordeste.

3 – Como é a distribuição de água no Brasil?

A distribuição das fontes de água no país é desigual. Enquanto a Amazônia, com cerca de 10% da população brasileira, detém 70% da disponibilidade da água doce do País, o Nordeste, com 30% da população nacional, dispõe de apenas 3% de toda a água doce do Brasil. Essa desigualdade é também flagrante no próprio Nordeste. Repare: a bacia do São Francisco concentra 63% da disponibilidade de água da região nordestina, sendo que 95% de sua vazão vai para o mar; a bacia do rio Parnaíba (Piauí/Maranhão) detém 15% da água disponível no Nordeste. Portanto, essas duas bacias dispõem de 78% das disponibilidades de água da região. Por sua vez, as bacias dos rios intermitentes nordestinos detêm apenas 22% da água disponível, os quais se concentram em alguns açudes estratégicos de grande porte e em aqüíferos profundos próximos à Zona Costeira. Em compensação, 2/3 da população residente estimada para 2025 vivem justamente nessas bacias deficitárias.

4 – Qual é a gravidade desse problema?

Essa concentração de população em uma área com pouca água cria sérios problemas econômicos e sociais. A disponibilidade hídrica per capita é inferior ao índice crítico de 1.000 m³/hab/ano, indicado pelas Nações Unidas como o mínimo para garantir a vida humana e a preservação ambiental. Nas bacias do São Francisco e do Parnaíba, esse índice é da ordem de 2.000 m³/hab/ano para a população estimada para o ano 2025. Nas bacias dos rios intermitentes, o índice já é, hoje, inferior a 1.000 m³/hab/ano, e tende para 500 m³/hab/ano ou menos, no ano 2025. Para que haja desenvolvimento sustentável equilibrado e harmônico na Região do Polígono das Secas, será necessário distribuir melhor a água local entre a população, integrando as bacias superavitárias às bacias deficitárias, além de construir os projetos de distribuição interna da água em cada sub-região. A situação hídrica do Nordeste Setentrional é agravada, ainda, pela maior probabilidade de ocorrência de secas, levando a crises sociais e econômicas periódicas, que acarretam pobreza, migrações e falta de competitividade econômica.

5 – O que é o Nordeste Setentrional?

O Nordeste Setentrional, situado ao norte da bacia do São Francisco, engloba os Estados do Ceará, Paraíba, Rio Grande do Norte, parte de Pernambuco (Agreste e Sertão) e parte de Alagoas.

6 – Em média, quanta água uma pessoa consome por ano?

Para viver plenamente em todos os aspectos, as Nações Unidas recomendam um consumo de no mínimo 1.000 m³ por habitante/ano, aí considerando a água não só para beber, mas para todos os usos sociais e econômicos que podem proporcionar uma vida digna ao homem. Só para produzir uma tonelada de alimentos são necessários, em média, 1.000 m³ de água. Atualmente, milhões de pessoas no semi-árido Nordestino sobrevivem com quantidades bem menores de água, mas isso impede que as atividades econômicas se desenvolvam normalmente, perpetuando a pobreza. Por essa razão, o semi-árido nordestino é uma das regiões mais pobres do Brasil e do mundo. Estima-se que cerca de 17,5 milhões de nordestinos vão ter 500 metros cúbicos ao ano – ou menos – à sua disposição, nos próximos 20 anos. Isso é menos da metade do mínimo recomendado pela ONU.

7 – Mas uma pessoa bebe no máximo uns três litros de água por dia, não é?

É verdade, mas a água não é só para beber. Todo mundo precisa tomar banho, cozinhar, lavar pratos, lavar roupa, dar descarga no banheiro, e assim por diante. Quando se faz a conta, o número é bem maior do que o necessário para beber. Além disso, na conta feita pelas Nações Unidas está incluída a água para o cultivo dos alimentos que cada pessoa vai consumir e para a produção de todos os itens que consome (roupas, livros, artigos industriais etc) individualmente ou, indiretamente, de forma coletiva.

 

IV – Outras soluções técnicas

1 – Não existe uma outra solução técnica mais econômica, como os açudes?

A água dos rios intermitentes do semi-árido setentrional já é armazenada em grandes açudes, mas investe-se muito nessas obras para disponibilizar relativamente pouca água. Para cada m³ de água disponibilizado, perdem-se 3 m³ por evaporação e vertimento (sangramento) nos açudes. Ou seja: é preciso represar 4 m³ para usar apenas um. Além disso, não há mais a possibilidade de guardar água nas bacias com novos açudes. O que poderá ocorrer, em muitas bacias, é que a construção de novos açudes necessários para distribuir água no território acabará causando mais perdas de água por evaporação, reduzindo a água disponível no conjunto da bacia.

2 – E os poços?

A opção pela captação de água em lençóis subterrâneos por meio de poços é viável, mas limitada ao volume renovável e só pode ser feita basicamente nos terrenos sedimentares permeáveis, que ocorrem em apenas cerca de 30% do Polígono das Secas, e de forma concentrada na zona costeira e no Estado do Piauí. Setenta por cento do semi-árido, portanto, não contam com essa opção, pois o terreno é pedregoso e não permite a infiltração de água. Há outras limitações, entre as quais a qualidade da água, muitas vezes com alto teor de sais e outros minerais, o que a torna imprópria para o consumo humano ou mesmo para irrigação.

3 – E as cisternas?

A coleta de água da chuva em cisternas garante água para beber no meio rural, para a população dispersa, para a qual, em geral, não se viabilizam longas adutoras, de alto custo, para atender a poucas pessoas. As cisternas, entretanto, não produzem modificações estruturais nem a inserção econômica da população rural nas condições modernas de vida. O uso de cisternas é válido numa conjuntura emergencial, mas muito precário se for a única fonte de água permanente. Para abastecer uma cisterna, é preciso uma área adequada de telhado, onde se faz a captação da água. Em muitos lugares, nem sempre existem áreas telhadas suficientes para manter as cisternas cheias, porque chove pouco. E nas secas prolongadas, a cisterna é um recurso que pode esgotar-se. Em resumo, apenas construir cisternas não resolve a questão principal, embora alivie a vida dos pobres dispersos no meio rural do sertão. Pesquisas feitas no semi-árido mostram também um outro problema grave: a contaminação das cisternas por coliformes fecais e outras fontes de poluição.

4 – O nordestino da região semi-árida depende mesmo do Velho Chico?

A solução dos problemas crônicos do semi-árido depende de fato de seu principal manancial hídrico, que é o Rio São Francisco, embora outras fontes de água possam ajudar. Ainda assim, essas fontes não substituem o Velho Chico, que deve ser o manancial complementar da região, na medida das necessidades de cada área, porque é a fonte hídrica mais próxima e de grande volume.

5 – A solução, então, é fazer mesmo a integração do Rio São Francisco com as bacias hidrográficas do semi-árido nordestino?

Sim, porque há um grande desequilíbrio entre a oferta de água e a população residente no Polígono das Secas: a bacia do São Francisco tem 70% da água e 21% da população do Polígono; já as bacias dos rios intermitentes nos diferentes Estados oferecem apenas 20% da água, mas concentram 70% da população da região. Para resolver esse desequilíbrio no Polígono das Secas, a melhor alternativa é fazer a integração do São Francisco com os rios intermitentes existentes nos limites de sua bacia hidrográfica, situada próxima e eqüidistante dos principais rios do semi-árido. Se, de um lado, existe um grande rio a ser cuidado para manter-se saudável, de outro existem rios que nem vivos são, só existem como fantasmas, quando e onde chove de forma imprevisível no semi-árido. Eles ressuscitam, por pouco tempo, nas estações das chuvas, mas logo, com a chegada do período de estio, seus leitos se tornam secos, de novo.

 

V – integração

1 – O que mudou no projeto atual em relação às propostas anteriores?

Mudou muita coisa. Em 1985, o projeto de transposição apresentado pelo DNOS previa a captação, em um único canal, de 300 m³/s destinados à irrigação. Esse projeto não previa a revitalização do Rio São Francisco, mas apenas a sua integração com os açudes Castanhão, no Ceará, e Armando Ribeiro Gonçalves, no Rio Grande do Norte. Em 1994, outra proposta, do então Ministério da Integração Regional, previa a captação de 150 m³/s, também para a irrigação e em um único canal, sem revitalização do Velho Chico, integrando os açudes Castanhão, Armando Ribeiro Gonçalves e Santa Cruz. No ano de 2000, o Ministério da Integração Nacional apresentou uma proposta de captação de 48 m³/s em dois canais, para uso múltiplo, também sem prever a revitalização do Rio São Francisco e integrando os açudes Castanhão, Armando Ribeiro Gonçalves, Santa Cruz, Epitácio Pessoa, Engenheiro Ávidos, Poço da Cruz e Entremontes, e beneficiando uma população 50% maior do que a dos projetos anteriores. Outros 15 m³/s seriam destinados à irrigação no próprio vale do São Francisco. O atual projeto vai captar apenas 26 m³/s, de forma contínua, e excedentes quando houver vertimento da barragem de Sobradinho. O projeto beneficiará até 12 milhões de pessoas em seis bacias hidrográficas, integrando os mesmos açudes constantes da proposta anterior. Haverá, também, e ao mesmo tempo, a revitalização do Rio São Francisco, cujas ações já começaram. Como se vê, diminuiu substancialmente a quantidade de água a ser agora captada, e o governo já está investindo na revitalização do Velho Chico, o que é muito importante.

2 – A integração de bacias hidrográficas já foi testada em outros países?

Ela tem sido adotada em inúmeros países como África do Sul/Lesoto, Egito, Equador, Peru, China, Espanha e EUA, interligando bacias superavitárias às bacias deficitárias. No Brasil, essa mesma tecnologia é usada em grandes sistemas de abastecimento de água em regiões metropolitanas (exemplos: São Paulo, Rio de Janeiro, Fortaleza e Brasília).

3 – Como é usada a água nos países que fizeram a integração de bacias?

Nessas regiões e países, o padrão típico de uso da água é de 70% na agricultura irrigada e 30% em outros usos (urbanos, industriais). Esse padrão típico é recomendável também para o desenvolvimento sustentável do Nordeste, porque viabiliza a geração de emprego e renda no interior, dando sustentabilidade econômica e social à população residente.

4 – A retirada da água do rio pode trazer prejuízos econômicos para os Estados de Minas Gerais, Bahia, Alagoas, Sergipe e Pernambuco, como se alega freqüentemente?

Não haverá prejuízos econômicos ou ambientais para os Estados banhados pelo Rio São Francisco, ressalvando uma pequena redução da geração de energia nas usinas da Chesf, o que não causará o menor problema, uma vez que o Nordeste está interligado ao sistema nacional de distribuição de energia. No caso de Minas Gerais, por exemplo, a captação de água ocorrerá centenas de quilômetros depois de o rio ter deixado o território mineiro. A primeira captação será feita após a barragem de Sobradinho, na divisa entre a Bahia e Pernambuco, num trecho cuja vazão já está regularizada por essa represa, o que também afasta o risco de afetar a navegação, os projetos de irrigação ou o abastecimento das cidades ribeirinhas dos dois Estados. A segunda captação será feita no lago de Itaparica, também na divisa entre Bahia e Pernambuco, onde não causará qualquer impacto econômico ou ambiental. Os Estados de Alagoas e Sergipe não serão afetados, porque a vazão do rio nesses Estados é plenamente regulada pelas represas da Chesf, que alterou as condições originais do rio próximo da foz. É importante destacar um aspecto relevante: as duas captações representarão apenas 26 m³/s.

5 – Quantas pessoas serão diretamente beneficiadas pela integração das bacias?

A população residente na área beneficiada pelos dois eixos da transposição é de 12 milhões de habitantes, sendo cerca de 5,5 milhões no Eixo Norte e 3,5 milhões no Eixo Leste. O total representa 30% da população do Polígono das Secas, sendo 50% maior que a população residente na bacia do São Francisco dentro do Polígono.

 

VI – Ações

1 – Existe um plano de gestão para o Rio São Francisco?

O Plano Plurianual do Governo Federal 2004/2007 priorizou inúmeras ações no setor hídrico para a Região Nordeste, com extensão prevista até o ano 2015. O Plano é composto de quatro grandes ações: (1) a Integração de Bacias do Nordeste; (2) a Revitalização Ambiental da Bacia do São Francisco; (3) os Projetos de Irrigação na Região; e (4) o Proágua, que visa o suprimento urbano.

2 – Como será feita a integração das bacias?

Dois canais serão construídos – um na direção Norte, que demandará ao Ceará e o Rio Grande do Norte, outro na direção Leste, que levará água para Pernambuco e Paraíba, beneficiando as áreas mais carentes do agreste e dos sertões desses quatro estados. Essas áreas têm como característica geológica a predominância de terrenos cristalinos (70% de área), onde não é possível armazenar água subterrânea de forma permanente nem desenvolver a açudagem intensiva, uma vez que poucos novos açudes de porte significativo podem ser ainda viabilizados. Nessas áreas, a potencialidade hídrica dos rios intermitentes já foi transformada em disponibilidade garantida, ao longo do último século, o que permitiu a vida, embora precária, de uma população de 14,6 milhões de habitantes no Polígono das Secas (censo de 2000). Significa também que o Nordeste Setentrional detém mais de 50% da população do Polígono. Em contrapartida, a soma das vazões regularizadas garantidas por todos os açudes significativos do Nordeste Setentrional representa apenas cerca 5% da vazão garantida no rio São Francisco pela barragem de Sobradinho.

3 – Onde vão ser feitas as obras de integração?

Os eixos de obras de integração de bacias planejados são: o Eixo Leste, que integrará o lago da Barragem de Itaparica, no rio São Francisco, com os rios Paraíba (PB) e Ipojuca (PE), beneficiando regiões populosas e com baixa disponibilidade hídrica; e o Eixo Norte, que sairá do rio São Francisco, próximo à cidade de Cabrobó (PE), e levará água até as bacias dos rios Jaguaribe (CE), Piranhas-Açu (PB/RN) e Apodi (RN).

4 – Por que vão ser construídos canais e não adutoras?

O volume de água variável a ser transportado é inadequado para o uso de adutoras. Nesse projeto, a construção de canais é melhor, tanto do ponto de vista técnico, quanto do econômico.

5 – Mas nos canais não ocorre maior evaporação da água?

A evaporação da água durante seu transporte até o local onde será armazenada e distribuída é pouco relevante, não justificando a opção pelo uso de adutoras. A evaporação preocupa, apenas, quando a água fica armazenada em grandes superfícies, por largos períodos. Aí sim, ocorrem perdas expressivas. Com a integração, essas perdas que hoje ocorrem nos açudes serão minimizadas em até 50%, porque os açudes vão operar menos cheios, não precisando guardar tanta água à espera de uma seca prolongada, freqüente e imprevisível. Havendo água do Rio São Francisco para assegurar o suprimento dos usos prioritários, as águas armazenadas nos açudes poderão ser gastas com maior liberdade no suprimento das demandas econômicas, como as agrícolas, gerando emprego e renda na produção.

6 – Então a água do rio vai abastecer açudes do semi-árido?

A integração do São Francisco com os açudes estratégicos do Nordeste Setentrional viabilizará uma nova regra operacional para essas barragens, que poderão operar de forma mais planejada. Ou seja, em vez de guardar água para um futuro distante, esperando uma seca prolongada (que ocorre com freqüência na área), poderá disponibilizar mais água para o uso social e econômico. Isso porque, em caso de seca, haverá sempre transposição de parte do volume retido em Sobradinho para os açudes, garantindo os usos mais prioritários da água. O projeto de integração de bacias significa um novo sistema de gestão da água no semi-árido, com economia futura significativa de águas locais dos rios intermitentes.

7 – Quanta água será retirada do rio São Francisco?

Será retirada uma vazão constante de 26 m³/s, correspondente ao consumo humano e animal, mais um excedente médio de 63 m³/s sempre que Sobradinho estiver cheio ou vertendo.

8 – A que altura que a água será bombeada?

No Eixo Norte, o bombeamento da água vencerá uma altura de 160 metros. Uma vez atingido o divisor topográfico de águas entre bacias, o canal seguirá por gravidade (sem bombeamento), gerando energia elétrica no percurso até a calha dos rios intermitentes. Como resultado, o bombeamento equivalente será similar ao bombeamento dos projetos de irrigação do Vale do São Francisco. O custo da água no Eixo Norte, em termos operacionais, será inferior ao do Eixo Leste e, com o ganho de água decorrente da economia de parte das perdas por evaporação nos açudes receptores, haverá viabilidade do uso múltiplo da água.

9 – E no Eixo Leste?

No Eixo Leste, a altura de bombeamento é mais elevada (300 metros para a Paraíba e 500 metros para o Agreste Pernambucano). A água terá utilização no setor urbano, onde a capacidade de pagamento viabiliza a sua transferência.

10 – Quais são os passos para iniciar a obra?

O primeiro passo é obter a licença ambiental, que está sob a análise do Ibama. Uma vez concedida a licença, as obras civis poderão ser licitadas e, em seguida, executadas.

11 – Quando a integração será iniciada?

O governo deseja iniciá-la em 2005, para o que já incluiu no Orçamento Geral da União (OGU) R$ 624 milhões.

12 – Quando a obra será concluída?

A primeira etapa deve estar pronta dois anos após o início de sua construção.

13 – Qual é o custo total do projeto?

A obra tem custo estimado em cerca de R$ 4,5 bilhões. Equivale ao custo de algumas hidrelétricas e gasodutos já construídos e/ou previstos no país.

Fonte

Relatório de Impacto Ambiental

Jonas Duarte
Coordenador do Curso de História e do Curso de MSC (Movimentos Sociais do Campo) da Universidade Federal da Paraíba

Todos sabem que me posicionei contra o atual projeto de transposição do Rio São Francisco. Defendi e defendo as propostas da ANA (Agência Nacional das Águas) e da ASA (Articulação do Semi-Árido) para o nosso semi-árido brasileiro. Modéstia a parte, me considero um entendido em semi-árido. Primeiro porque nasci, vivi e vivo a realidade daquelas terras. Depois porque minhas pesquisas de mestrado e doutorado foram sobre semi-árido. Meus estudos teóricos e muitas das minhas práticas são no semi-árido. Sou um caririzeiro matuto, daqueles que se orgulham de ser matuto e defende suas origens com garra. Como diz o grande poeta Elomar, sou daqueles que pelo meu torrão, “se um dia lhe fizerem guerra seu filho vem morrer por ti”. Considero que o governo optou pelo projeto das grandes obras da grande visibilidade, do impressionismo. A política tem disso. Além do que, há uma confluência de forças sociais muito fortes em defesa do projeto. Desde grandes conglomerados econômicos, de olho nas obras faraônicas e nos negócios de dela advirão, até pessoas e organizações bem intencionadas que crêem firmemente que só há essa solução, passando por uma gama de políticos dos mais desclassificados, com demagogia que dói nos ouvidos, tirando suas casquinhas eleitorais. A seguir, de forma pontual, apresento minhas discordâncias do projeto e minhas idéias a respeito de tudo isso.

 

Sobre o semi-árido

 

O semi-árido brasileiro é uma grande área que abrange oito estados do Nordeste, o norte de Minas e hoje já se expande pelo norte do Espírito Santo, chegando a praticamente um milhão de quilômetros quadrados, onde reside cerca de 36 milhões de pessoas. É a área do Brasil onde ainda perdura uma população rural equiparada à urbana e onde predomina uma população urbana que vive de atividades rurais, pois a grande maioria dos municípios do nosso semi-árido são municípios minúsculos, embora se tenha alguns de populações entre 50 e 100 mil habitantes. É um ecossistema com características próprias. Digo isso pra alertar algumas pessoas que confundem bioma e ecossistema. O bioma Caatinga, formado pela flora e fauna, é o bioma predominante no ecossistema do semi-árido que assim se denomina pois sua média de precipitação pluviométrica é entre 300 mm e 800 mm. Na classificação de climas no mundo, quem recebe uma precipitação média anual abaixo de 300 mm é tido como de clima árido, acima de 800 mm e abaixo de 1200 mm semi-úmido e, acima de 1200 mm, úmido.

 

O mundo tem cerca de 75% de sua área sob climas semi-árido ou árido. O semi-árido brasileiro é o mais populoso do mundo e o que mais chove. Para se ter uma idéia, o nosso semi-árido chove cerca de 750 mm/ano, em média. Há nele uma tremenda irregularidade espacial e temporal dessas chuvas. Isto é, essa chuva pode cair toda em poucos dias e num lugar restrito, mas pode passar dias sem chover em grandes áreas. Na Paraíba, por exemplo, nas regiões do Cariri, Seridó e Curimataú chove entre 300 mm (no limite mínimo – Cabaceiras, Soledade, Olivedos, São Vicente, etc.) e chove 800 mm em média no Alto Sertão. Contudo, no sertão, a chuva é mais concentrada em menos tempo. Quase todo ano chove. Ao contrário do que se divulga na mídia, o período de estio, geralmente de sete a oito meses, não pode ser considerado seca. Faz parte da normalidade climática do ecossistema. De fato, só ocorre seca quando no período que se espera chover não chove. Isso varia de áreas para áreas. Na Paraíba, no sertão se espera chuva a partir de janeiro. No Cariri, a partir de março – embora possam cair, e geralmente caem, chuvas antres o todo, em média, pelos cálculos da ANA, precipita e passa pelo semi-árido nualmente aproximadamente 750 bilhões de metros cúbicos de água – ou, pderíamos dizer, cerca de dois mil açudes de Boqueirão cheios. Desse total e água que banham o semi-árido, temos estrutura para armazenar cerca de 36 ilhões de metros cúbicos. Mesmo assim esses 36 bilhões de metros cúbicos rmazenados estão inacessíveis para grande parte da opulação.

 

O maior problema no armazenamento de água no semi-árido é protegê-la da vapotranspiração e garantir sua qualidade. A evapotranspiração é a perda ela evaporação, ou seja, o sol bebendo e, pelo processo de respiração das lantas, a transpiração. O acumulado de água nos quatro meses que descem dos éus sobe para lá, nos oito restantes para completarem o ciclo natural. Por utro lado, os nossos solos são na maioria ricos em sais, podendo facilmente ransmitir os sais para as superfícies e com a evaporação das águas os sais icarem em excesso na superfície, prejudicando atividades produtivas. Ainda á o problema do nosso subsolo, a grande maioria composto por rochas cristalina, impedindo a formação de grandes aqüíferos. Ficando apenas as falhas das formações rochosas para o acumulo da água que consegue penetrar, há outro problema, pois o solo compacto e o regime pluviométrico de chuvas rápidas e fortes dificulta a penetração de água para o subsolo.

 

Sobre o bioma caatinga

 

A caatinga é o bioma predominante do semi-árido. É a biodiversidade existente sobre o ecossistema. A caatinga é pouquíssima estudada e conhecida. Foi tida, ao longo dos anos, como o bioma pobre e triste do Brasil; se construiu uma imagem de uma flora feia, garranchenta, espinhenta e retorcida. Quem leu “Os Sertões” de Euclides da Cunha certamente fica com pena de quem escolheu ali pra viver, pois ele descreve a flora caatingueira como uma coisa horrível e o semi-árido como um lugar inóspito. Não é nada disso. A caatinga, a mata branca dos nativos tapuias, guarda uma biodiversidade maravilhosa, hoje estudada corajosamente por biólogos, agrônomos e engenheiros florestais. Está se descobrindo um banco de vidas e uma história dessa vegetação extraordinária. A mata branca tem milhões de anos e há cerca de 12 mil enfrentou sabiamente a mudança climática na nossa região, adaptou-se e hoje vive vigorosa e firme em nossos sertões, sendo violentada brutalmente pelos modelos de desenvolvimento econômicos que a tinham e a tem como um problema. Por outro lado, abriga uma fauna, riquíssima e bela. Se compararmos a nossa caatinga com a maioria dos biomas mundiais, a classificaremos como um dos mais ricos.

 

Antes da chamada Revolução Verde, má denominação dada ao processo de desenvolvimento da agricultura brasileira a partir de meados dos anos 60, tínhamos cerca de 88% de nosso sertão de caatinga preservada. Com a modernização dolorosa, usando o termo de Graziano, levada a cabo pela ditadura militar, a caatinga foi trucidada. Hoje temos menos de 28% desse bioma, que deve ser a base de toda estrutura produtiva que se imaginar ambientalmente louvável no semi-árido.

 

O processo de modernização da agricultura do semi-árido levou a destruição ambiental e intensificou a concentração de terras e de rendas. O mais grave desse processo é a desertificação, ou seja, a destruição gradual dos solos. Estudos do programa de pós-graduação de engenharia agrícola da UFCG indicam que os solos do semi-árido hoje, em média, detém apenas 60% da fertilidade que detinham em meados dos anos 60. Calcula-se, sem alarme que, caso continuemos a explorar erradamente os solos do semi-árido, nos próximos 40 anos teremos desertos enormes, como em algumas áreas já se apresentam manchas.

 

68% do semi-árido nordestino estão em grave ou muito grave processo de desertificação. Resultado desses equívocos. Já temos cinco núcleos de desertos, em Gilbués (PI), Seridó (PB e RN), Iraúçuba (CE), Cabrobó (PE) e em outro que não lembro agora. Se olharmos o mapa da desertificação no semi-árido, veremos que há uma grande faixa às margens do São Francisco, exatamente onde se pratica a irrigação. Isso porque apenas 3% das áreas nordestinas são passíveis de irrigação. Esse processo de desertificação é resultado de uma pratica econômica incompatível com o ecossistema e não verificar as especificidades do meio ambiente.

Além disso, a caatinga estudada e bem trabalhada tem oferecido excelentes possibilidades econômicas e sociais e demonstrado grande potencialidade produtiva.

 

Sobre o processo histórico

 

O semi-árido é o berço do coronelismo brasileiro. Do mandonismo, do autoritarismo e das formações oligarcas onde o povão trabalhador foi e é tratado como bicho. Essas oligarquias dominaram os sertões, suas riquezas e suas populações e as usaram e usam como moeda política na engrenagem do sistema federativo brasileiro. Foi através da utilização do discurso das secas que essas oligarquias se mantiveram e se mantém mamando nas tetas do erário público.

 

Se desenvolveu a pecuária extensiva. No último quarto do século XIX, se desenvolveu a cotonicultura. Ao longo do século XX, se desenvolveu o DNOCS e toda infra-estrutura de armazenar e de levar água para os mais distantes lugares do sertão. Também se desenvolveu a “indústria da seca”, espécie de mecanismo de apropriação dos recursos destinados as obras nos sertões pelas oligarquias locais.

 

Nos anos 50, criou-se a SUDENE, uma coordenação de todos os órgãos regionais com a função de reverter o processo de evasão de capitais e de empobrecimento da região em relação aos centros industrializados. Caberia ao Estado comandar o processo de desenvolvimento.

 

O diagnóstico da SUDENE e de Celso Furtado era de que no semi-árido se montou uma estrutura produtiva inadequada ao clima, como também havia uma superpopulação naquela área. Furtado propôs uma reforma agrária radical no entorno do semi-árido, ou seja, meio-norte maranhense, sul do Piauí, oeste maiano e mata leste de Alagoas ao Rio Grande do Norte. Ali, se produziria alimentos para o semi-árido e para os centros urbanos que viriam a se industrializar. O semi-árido se especializaria em pecuária, visto ser sua vocação natural, e alimentaria de leite, carne e peles o restante do Nordeste. Assim, comportaria uma população bem inferior.

 

Com o golpe de 1964, as oligarquias tomaram a SUDENE. Transformaram-na no instrumento de seu desenvolvimento. Visitei, durante minhas pesquisas de doutorado, alguns dos grandes projetos da SUDENE/FINOR. Nunca as oligarquias nordestinas pegaram em tanto dinheiro para mega-projetos. O NE cresceu, economicamente falando, mais do que o Brasil durante o “milagre econômico”, mas nunca se concentrou tanta riqueza, nunca se expulsou tantas pessoas do campo e da região. Tivemos, entre os anos 1960 e 1980, cerca de oito milhões de sertanejos expulsos de suas terras – isso em um período de altíssimo desenvolvimento econômico e que, entre 1960 e 1979, não houve seca. Portanto, caros amigos e amigas, quem expulsou os sertanejos não foi a seca; foi a estrutura socioeconômica fundada ali.

 

Nos anos 1990, FHC e seu bando destruíram a SUDENE e o DNOCS. O DNOCS foi substituído pela iniciativa privada. Para se ter uma idéia, a manutenção das barragens e açudes construídas pelo DNOCS passaram a ser mantidas por empreiteiras, na maioria sem um corpo técnico suficiente e sem conhecer a fundo a história das obras hidráulicas do Nordeste. Ficou risível e ridículo vermos técnicos do DNOCS lotados em órgãos federais sem nenhuma atribuição de engenharia e o Estado brasileiro gastando fortunas com empreiteiras para fazer os trabalhos de manutenção das barragens. Algumas não suportaram e foram embora nas primeiras chuvas; outras estão ameaçadas e prontas para causarem novos desastres.

 

Diziam os neoliberais de plantão que, com o fim das grandes obras estruturantes no semi-árido, o DNOCS havia perdido sua razão de ser e que agora caberia a iniciativa privada manter as obras. Para essas, era pouco.

 

Queiroz Galvão, Odebrecht e outras gigantes da construção reclamaram dos poucos recursos destinados as obras civis no governo Lula e foram aos meios de comunicação reclamar contra o fato da duplicação da BR-101 ser feita peloExército brasileiro. Quem não se lembra de Alexandre Garcia e Mirian Leitão duvidando da competência do nosso Exército e ironizando o fato de no governo Lula as estradas estarem sendo recondicionadas pelos militares?

 

No governo atual, algumas ações têm alterado substancialmente a vida dos sertanejos. Por exemplo, o Bolsa Família, com todas as falhas e críticas que possamos ter, dinamiza as economias daquelas milhares de pequenas cidades que predominam no sertão brasileiro. Alguns projetos se destacam: na Paraíba, por exemplo, o Programa do Leite tem um efeito bastante positivo nas economias locais desses municípios, embora seja eivado de problemas.

 

Passou-se despercebido o fato de que 2006 foi um ano seco na microrregião dos Cariris Oriental. Choveu bem menos de 300 mm e não houve uma cidade em estado de calamidade. Isso porque a atividade pecuária na região estava remunerando satisfatoriamente – coisa que agora já não está, em função do aumento do preço da soja e do milho, relacionado com a política do biocombustível…

 

Sobre o projeto de transposição

 

A transposição do São Francisco é um projeto antigo, do século XIX, pensado pelo corpo de engenheiro do Imperador Pedro II. De lá pra cá, a engenharia evoluiu bastante e novas técnicas e tecnologias de transporte de água a longa distância se aperfeiçoaram – como também nesse período se modificou
bastante a visão sobre semi-árido.

 

O projeto propõe vazar o rio em dois canais e transportar 26 metros cúbicos de água por segundo, dos quais cerca de 70% seria destinado ao eixo norte e 30% ao eixo leste. No eixo norte, nos primeiro 400 quilômetros serão feitos canais de cimento de 25 metros de largura e dois de profundidade; no eixo leste, serão 200 km da mesma engenharia.

 

Para transportar o líquido por canais abertos terão que ser feitas seis barragens de captação, de onde a água será bombeada para novos canais até chegar ao leito dos rios Paraíba, no eixo leste, 304 metros acima da barragem original de Itaparica e com mais ou menos a mesma altura no eixo norte. A partir daí, uma série de canais e leitos de rios temporários levarão a água a seu destino; 70% da água deve ser destinada a projetos de irrigação, 26% para abastecimento urbano e 4% para populações rurais do semi-árido. O objetivo divulgado pelo governo é beneficiar 12 milhões de nordestinos.

 

Para se defender das acusações de ambientalistas os defensores da transposição nesse projeto, o governo apresentou um projeto paralelo de revitalização do São Francisco. E submeteu o projeto de transposição ao IBAMA para análise dos impactos ambientais.

 

Sobre a revitalização, o projeto não prevê uma série de exigências dos ambientalistas, como também nem discute a revitalização de nenhum rio do semi-árido. Sobre o relatório de impacto ambiental do IBAMA, são apontados onze impactos negativos e mais de cem ações que devem ser tomadas no sentido de reduzir os impactos a que se refere. Além disso, o IBAMA não analisou o impacto ambiental na foz do São Francisco.

 

Técnicos da ANA, especialistas em recursos hídricos, calculam que será em torno de 55% a evaporação dessas águas nos canais de cimento, não tendo como precisar esse processo nos leitos dos rios, pois é preciso ver em que condições essas águas vão passar por esses rios. Isto significa que, de cada 100 litros de água que sairá do São Francisco, cerca de 45 chegará à nascente do Paraíba, por exemplo.

 

Outro ponto é que a obra será realizada por empreiteiras, cabendo ao Exército preparar apenas as bacias de captação, avaliadas em 6,5 bilhões de dólares e com uma previsão de 12 anos para sua conclusão.

 

Sobre a proposta da Agência Nacional de Águas (ANA), Articulação do Semi-árido Brasileiro (ASA) e dos Movimentos Sociais

 

A ASA e os movimentos sociais estão tentando apresentar ao governo e à sociedade civil a proposta da ANA. Essa descarta os canais de cimento e a água para projetos de irrigação. Sugere a captação no São Francisco e o transporte do líquido via adutora. Indica o abastecimento de 1.112 cidades com mais de cinco mil habitantes, abastecendo um total de 34 milhões de nordestinos em áreas urbanas. Propõe a aplicação de 142 técnicas e tecnologias de convivência com o semi-árido, que reeducam as populações no uso e no armazenamento da água, no uso dos solos e da vegetação. Busca valorizar o semi-árido e tratar o desenvolvimento em harmonia com o meio ambiente. É uma proposta que tem como alvo as populações carentes, a agricultura familiar, as populações difusas e que amarra o desenvolvimento econômico com o social e a questão ambiental – algo que, se no mundo todo é uma questão importante, no semi-árido é essencial.

 

Estudei bem as duas propostas e não tenho dúvidas. As propostas dosmovimentos sociais do campo tem um recorte popular e democrático claro. Acho que o semi-árido tem essa chance no governo Lula, um governo que pode se abrir às propostas desses movimentos. Acho também que se houver um debate amplo, democrático, a sociedade vai entender o que se passa de fato e não cair nessa esparrela emocional em tornaram o debate.

 

O mais grave é a ilusão que os defensores do projeto de transposição criaram nas camadas populares, algo que temo que se volte contra os democráticos do governo. Já vejo a direita baixando a lenha no governo quando tiver a primeira seca. Duvido que D. Aldo Paggoto apareça dizendo que não era bem assim…

 

Alguns falam em redenção do sertão, que será o fim dos carros pipas, da lata d’água na cabeça, da falta de água pra os animais. Isso é tudo mentira deslavada. Sacanagem pura, das mais cruéis.

 

Quando dava uma entrevista a uma rádio, o repórter narrou ter visto uma vaca morrer de fome em Olivedos e disse que esperava que, com a transposição, iria acabar a seca naquele município e não veria cenas daquela. Nem o mais cínico político nordestino pode ter o descaramento de dizer que o atual projeto de transposição acabará a sede e a fome dos animais na região. Penso que se o repórter, iludido, conhecesse a proposta de convivência com o semi-árido aderiria facilmente ao projeto.

 

Conheço vários produtores no Cariri que tem forragens para animais armazenados para suportar três anos de seca e que fazem forragens para suasvacas com 250 mm de chuvas. Estão apenas aproveitando bem as chuvas, sem ainda conhecer e sem utilizar as técnicas e tecnologias que a proposta da ANA procura difundir por todo o semi-árido.

 

Fonte

IstoÉ – Edição 1990 – 19/12/2007

Acusado de isolacionismo e de maquiar dados sobre a Amazônia, o País admite negociar créditos de carbono, prova seus números e desmente relatório dos EUA

Por LUCIANA SGARBI

FIRDIA LISNAWATI/AP/IMAGE PLUS
NÃO OFICIAL Manifestantes de ONGs fazem ato contra a deterioração do clima pelos países ricos

Chama-se Geni uma das mais famosas personagens criadas por Chico Buarque. Quando precisam dela, correm a bajulá-la e imploram-lhe favores; quando não precisam, a coisa menos poluída que lhe atiram são pedras. Na 13ª Conferência da Convenção de Mudança Climática das Nações Unidas, que reuniu representantes de 190 países na ilha indonésia de Bali, autoridades governamentais e ONGs de diversas nações elegeram a Amazônia como a Geni da deterioração do clima do planeta – confessaram precisar dela para que o mundo sobreviva, imploraram-lhe por preservação e menos emissão de CO2, mas, ao mesmo tempo, atacaram-na com estatísticas um tanto poluídas sobre a sua devastação. Na quarta-feira 12 o ministro brasileiro das Relações Exteriores, Celso Amorim, decidiu partir para o contraataque e recolocou, no colo de cada um, os sapos que vinha engolindo ao longo de dez dias. O maior deles pulou de volta para um brejo de dimensões amazônicas, que é o relatório dos EUA: “Cinqüenta e cinco por cento da Amazônia será destruída até 2030, a floresta será uma grande savana no futuro.” O ministro rebateu, foi aplaudido e não houve voz discordante.

Amorim admitiu que a redução de CO2 no Brasil ainda está aquém das expectativas (na verdade, muito aquém para uma floresta que em meio século perdeu 700 mil quilômetros quadrados de seu verde), mas enumerou: “O desmatamento caiu pelo terceiro ano consecutivo e atingiu o menor índice já registrado, de 11.224 quilômetros quadrados. Sabemos que isso ainda é pouco, mas pelo menos estamos investindo em energias limpas e programas sustentáveis, enquanto há países industrializados que nem sequer ratificaram o Protocolo de Kyoto” – leia-se EUA. Assim como ele, também a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, foi acusada por ONGs internacionais de ter exibido em Bali dados maquiados sobre a situação da devastação e emissão de CO2. No Brasil saiu em sua defesa o ministro em exercício João Paulo Capobianco: “Como a floresta Amazônia tem quatro milhões de quilômetros quadrados, mesmo que devastássemos 30 mil quilômetros por ano não chegaríamos aos dois milhões preconizados pelos EUA para 2.030.” Pode-se alegar que Capobianco talvez seja parcial porque integra o governo, mas pesa a favor de sua isenção o fato de ele próprio concordar em que ainda há muitos problemas – só que não na proporção apresentada pelo relatório americano. “É verdade que o sistema de monitoramento registra tendência de aumento no desmatamento nos últimos quatro meses”, diz Capobianco. “Mas deve-se isso ao longo período de seca e a subida dos preços das commodities agrícolas, sobretudo da soja e da carne.” Enquanto o ministro interino apagava os incêndios em Brasília, em Bali a própria titular decidiu trocar o discurso técnico pelo político – e neutralizou as acusações de que se mantinha numa posição isolacionista.

Aí veio a surpresa. O Brasil criou um fato novo quando Marina e Amorim anunciaram que “admitem negociar créditos de carbono” pela conservação da Amazônia na tentativa de conter o aquecimento global, mas ressalvando que “essa medida fica condicionada a revisões periódicas”. Tenta-se, assim, fechar o guichê de negócios de créditos de carbono através do qual países florestais assumiam a responsabilidade pela redução de CO2 enquanto algumas nações altamente industrializadas continuavam a poluir livremente. “Precisamos tomar cuidado com o supermercado do carbono”, alertou o coordenador do Greenpeace na Amazônia, Paulo Adario. “Estamos nos dispondo a ter metas internas e verificáveis”, disse Marina. “O Brasil está pronto para aprimorar seus programas para reduzir emissões de forma mensurável e aberta à revisão universal periódica”, arrematou Amorim. A proposta consiste na criação do Fundo de Proteção e Conservação da Amazônia Brasileira, que aumentará os recursos de combate ao desmatamento sempre que o País provar que reduziu a taxa de devastação da floresta abaixo de um nível – até 2012 esse nível será de 19,5 mil quilômetros quadrados. Entusiasmado, o ministro de Cooperação Internacional da Noruega, Erik Solheim, anunciou que destinará anualmente cerca de US$ 540 milhões para preservar florestas tropicais. Bastante aplaudido, o entusiasmo de Solheim subiu e involuntariamente ele foi politicamente incorreto ao elogiar o Brasil: “A proposta brasileira mata vários pássaros com uma pedrada só.” Amorim, de imediato, corrigiu: “Ressuscita vários pássaros.”

ANDRÉ DUSEK/AG. ISTOÉ
“VAMOS REDUZIR A EMISSÃO DE POLUENTES DE FORMA MENSURÁVEL”
Celso Amorim, ministro das Relações Exteriores

Fonte

03/01/2008 – CIDADES – JORNAL O NORTE
Degradação
DANOS À NATUREZA
Comunidade de Forte Velho, em Santa Rita, teme que outros viveiros rompam e atinjam suas residências

Fernanda Medeiros
fernanda@jornalonorte.com.br

A comunidade de Forte Velho, em Santa Rita, foi surpreendida com um viveiro de camarão que rompeu, contribuindo para aterrar o mangue local. A reportagem foi até o local acompanhando uma equipe de fiscalização do Ibama e a Associação Paraibana dos Amigos da Natureza (Apan) para ver o dano causado à natureza. A carcinicultura que vinha sendo explorada no local por uma empresa, há cerca de cinco anos, estava proibida através de processo na Justiça, devido aos danos que vem causando ao meio ambiente. Mas há quatro meses foi concedida uma liminar que permitiu o funcionamento dos viveiros. “Vamos entrar com um recurso na justiça federal para tentar derrubar a liminar que concede o funcionamento dos viveiros”, afirmou Paula Frassinete, integrante da Apan.

Os moradores agora convivem com o medo de que outro viveiro possa romper. “Ainda bem que a água do viveiro que estourou foi direto para o mangue. Já pensou se romper os que ficam por trás das casas da gente, na rua da Alegria? Estive pensando até em procurar uma casa em Cabedelo, porque tenho medo de uma tragédia”, disse a dona-de-casa Maria de Lourdes Ferraz, que vive na localidade há 50 anos. Ao todo, vivem na região, segundo o líder comunitário Luiz Carlos de Almeida Gonzaga, cerca de 2 mil pessoas.

O presidente da Associação dos Moradores de Forte Velho, Jozemir Eduardo da Silva, lamenta que a empresa que explora camarão tenha voltado a funcionar. “A gente já tinha até começado a pegar caranguejo e camarão de novo. Mas, desde que eles voltaram a funcionar, o drama das famílias voltou”, afirma.

Segundo o fiscal do Ibama, Carlos Fernando Pires, “a olho nu, qualquer leigo é capaz de identificar os danos que a região vem sofrendo com a exploração do camarão ao longo dos anos. Mas vamos fazer um relatório técnico para tomar as devidas providências”, afirmou.

Carlos Pires afirmou que tentou entrar na empresa, mas um funcionário disse que não tinha autorização para permitir a inspeção. “Só poderíamos, realmente, entrar se estivéssemos com o mandado expedido pela justiça”.

SAIBA MAIS

O líder comunitário da região, Luiz Carlos de Almeida Gonzaga, contou que o projeto de criação de camarão nas proximidades da Rua da Alegria, em Forte Velho, surgiu em 2002. Ele conta que já em 2003 os moradores começaram a sofrer as conseqüências. “A água das cacimbas, que servia para beber, ficou salobra e o problema é tão sério que até a água de coco também sai salobra. A comunidade é obrigada a andar oito quilômetros para comprar água para o consumo”, acrescenta.

Os moradores denunciam que o lençol freático ficou contaminado e as 17 cacimbas da região ficaram salinizadas, impróprias para o consumo humano. “Tinha cacimba de mais de 100 anos de existência, onde os moradores bebiam da água, mas agora ela está salobra”, explicou Luiz Carlos.

De acordo com Jozemir Eduardo, quando é feito o recolhimento do camarão, conhecido como ‘despesca’, os viveiros são esvaziados e a água é despejada diretamente no mangue. Segundo a Apan deveria haver pelo menos uma lagoa de estabilização para evitar que o problema de danos a natureza fosse tão sério.

Ao todo são 13 viveiros de camarão existentes em Forte Velho. Até o final desta edição a reportagem de O NORTE não conseguiu contato com os responsáveis pela empresa que explora o viveiro que rompeu.

FONTE

19/01/2008 – CIDADES – JORNAL O NORTE

Em Forte Velho – Santa Rita – Paraíba

Sábado, 19 de Janeiro de 2008, 12h56

A Justiça Federal, na última quinta-feira, dia 17, determinou a paralisação imediata das atividades dos viveiros de criação de camarão instalados na comunidade Forte Velho, em Santa Rita. A decisão foi tomada após o rompimento de um dos viveiros, no dia 31 de dezembro de 2007, segundo informou o procurador-chefe do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Bruno Dunda. Ele pediu a revogação de uma liminar que foi concedida, há cerca de cinco meses, para que a empresa responsável pelo empreendimento voltasse a funcionar, já que estava fechado por determinação judicial. O procurador informou, ainda, que os fiscais vão a Forte Velho para saber se a decisão da justiça está sendo cumprida.

Os moradores da região afirmaram que até nesta sexta-feira, dia 18, pela manhã, as atividades estavam sendo realizadas normalmente. “Os viveiros continuam cheios e a empresa está funcionando”, afirmou um dos líderes de Forte Velho, Luiz Gonzaga.

Com o rompimento de um tanque de camarão, a empresa foi autuada e as atividades embargadas pelo Ibama. Mas, como a empresa continua funcionando, os moradores temem que outros viveiros, já que existem 13, possam romper. E se isso acontecer, a tragédia poderá ser maior porque alguns ficam bem próximos às casas dos pescadores.

A implantação dos viveiros, que começou em 2002, foi objeto de diversas ações movidas pelo Ministério Público Federal. Entre elas uma Ação Civil Pública e duas ações penais, pelos crimes de desobediência e poluição, tendo em vista o funcionamento não autorizado do viveiro.

O procurador regional dos Direitos do Cidadão, Duciran Farena, disse que o rompimento do viveiro é uma prova incontestável de que o empreendimento não tem a mínima condição de funcionamento. O Ministério Público Federal proibiu, novamente, o funcionamento do viveiro, que não deverá voltar a operar, nem a pretexto de prova da não ocorrência de poluição.

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Os recifes de coral terão em 2008 o seu Ano Internacional. A promoção é da entidade Iniciativa Internacional para os Recifes de Coral (ICRI) que pretende utilizar o evento como estratégia para aumentar o conhecimento e a conscientização sobre a importância dos recifes de coral, bem como chamar a atenção para o aumento das ameaças e perdas de recifes de coral e ecossistemas associados, tais como manguezais e banco de algas.

O Ano Internacional além do esforço global para aumentar a consciência e o conhecimento sobre o assunto é também uma forma de se apoiar trabalhos de conservação, pesquisa e manejo. A mesma estratégia foi utilizada há 10 anos, quando 1997 foi também declarado Ano Internacional dos Recifes de Coral.

Na ocasião, a iniciativa foi considerada um sucesso, tendo obtido a participação de mais de 225 organizações em 50 países e territórios e alimentado centenas de pesquisas científicas que deram origem a novas áreas marinhas protegidas, além do surgimento de numerosas organizações locais e globais dedicadas à conservação dos corais.

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O Ministério do Meio Ambiente participa este mês, em Washington (EUA), da reunião da Iniciativa Internacional de Conservação dos Recifes de Coral (ICRI, na sigla em inglês). O evento, entre os dias 20 e 27 de janeiro, marca o início dos trabalhos do Ano Internacional dos Corais e reunirá governos, organizações internacionais e e ONG ambientais de todos os países membros da iniciativa, como Hawai, México e Indonésia.

Durante o encontro serão apresentadas as evoluções dos trabalhos de conservação de corais no mundo, bem como as metas e projetos programados para 2008. Entre os principais desafios do ICRI está o de promover o reconhecimento da importância dos serviços ambientais que os corais realizam para o desenvolvimento sustentável. O Brasil possui as únicas formações recifais do Atlântico Sul, distribuídas por aproximadamente 3 mil quilômetros de costa. Em todo o País, existem 10 Áreas Protegidas, o equivalente 18,53% de toda o litoral.

Segundo os pesquisadores, os corais estão para o ambiente marinho da mesma forma que as florestas tropicais estão para os terrestres, ou seja, são os maiores centros de biodiversidade do planeta. Eles protegem a costa da ação inesperada das ondas e abrigam e protegem grande número de organismos que são capturados e consumidos pelo homem, fazendo o papel de criadouro desses organismos. Além disso, servem como fonte de matéria-prima para pesquisas farmacológicas.

Mesmo assim, estão gravemente ameaçados pela ação do homem. Atividades como o turismo, a exploração de petróleo e a contaminação da água por substâncias tóxicas contribuem para a degeneração desses animais marinhos.

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IstoÉ – 08 a 14/07/2007

   
Entrevista

Pesquisador diz que tendência dos próximos anos é o esfriamento da Terra e que efeito estufa é tese manipulada pelos países ricos

Por RODRIGO RANGEL

ROBERTO CASTROO professor Luiz Carlos Molion é daqueles cientistas que não temem nadar contra a corrente. Na Rio 92 (ou Eco 92), quando o planeta discutia o aumento do buraco na camada de ozônio, ele defendeu que não havia motivo para tamanha preocupação.

Numa conferência, peitou o badalado mexicano Mario Molina, mais tarde Nobel de Química, um dos primeiros a fazer o alerta. Agora, a guerra acadêmica de Molion tem outro nome: aquecimento global. Pós-doutor em meteorologia formado na Inglaterra e nos Estados Unidos, membro do Instituto de Estudos Avançados de Berlim e representante da América Latina na Organização Meteorológica Mundial, esse paulista de 61 anos defende com veemência a tese de que a temperatura do planeta não está subindo e que a ação do homem, com a emissão crescente de gás carbônico (CO2) e outros poluentes, nada tem a ver com o propalado aquecimento global. Boa notícia?

Nem tanto, diz. Molion sustenta que está em marcha um processo de resfriamento do planeta. “Estamos entrando numa nova era glacial, o que para o Brasil poderá ser pior”, pontifica. Para Molion, por trás da propagação catastrófica do aquecimento global há um movimento dos países ricos para frear o desenvolvimento dos emergentes. O professor ainda faz uma reclamação: diz que cientistas contrários à tese estão escanteados pelas fontes de financiamento de pesquisa.

ISTOÉ – Com base em que o sr. diz que não há aquecimento global?
Molion – É difícil dizer que o aquecimento é global. O Hemisfério Sul é diferente do Hemisfério Norte, e a partir disso é complicado pegar uma temperatura e falar em temperatura média global. Os dados dos 44 Estados contíguos dos EUA, que têm uma rede de medição bem mantida, mostram que nas décadas de 30 e 40 as temperaturas foram mais elevadas que agora. A maior divergência está no fato de quererem imputar esse aquecimento às atividades humanas, particularmente à queima de combustíveis fósseis, como petróleo e carvão, e à agricultura, atrás da agropecuária, que libera metano. Quando a gente olha a série temporal de 150 anos usada pelos defensores da tese do aquecimento, vê claramente que houve um período, entre 1925 e 1946, em que a temperatura média global sofreu um aumento de cerca de 0,4 grau centígrado. Aí a pergunta é: esse aquecimento foi devido ao CO2?

Como, se nessa época o homem liberava para a atmosfera menos de 10% do que libera hoje? Depois, no pós-guerra, quando a atividade industrial aumentou, e o consumo de petróleo também, houve uma queda nas temperaturas.

ISTOÉ – Qual seria a origem das variações de temperatura?
Molion – Há dez anos, descobriu-se que o Oceano Pacífico tem um modo muito singular na variação da sua temperatura.

Me parece lógico que o Pacífico interfira no clima global. Primeiro, a atmosfera terrestre é aquecida por debaixo, ou seja, temos temperaturas mais altas aqui na superfície e à medida que você sobe a temperatura vai caindo – na altura em que voa um jato comercial, por exemplo, a temperatura externa chega a 45 ou 50 graus abaixo de zero. Ora, o Pacífico ocupa um terço da superfície terrestre. Juntando isso tudo, claro está que, se houver uma variação na temperatura da superfície do Pacífico, vai afetar o clima.

ISTOÉ – O IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática, da ONU) está errado?
Molion – O painel não leva em consideração todos os dados. Outra coisa que incomoda bastante, e que o Al Gore [exvice- presidente dos EUA e estrela do documentário Uma verdade inconveniente, sobre mudanças no clima] usa muito, é a concentração de CO2. O IPCC diz claramente que a concentração atingida em 2005, de 339 partes por milhão, ou ppm, foi a maior dos últimos 650 mil anos. Isso é uma coisa ridícula. Eles usam uma série iniciada em 1957 e não fazem menção a medições de concentração de gás carbônico anteriores. É como se nunca ninguém tivesse se preocupado com isso.

O aumento de CO2 não é um fenômeno novo. Nos últimos 150 anos, já chegou a 550, 600 ppm.

Como é que se jogam fora essas medidas? Só porque não interessam ao argumento? O leigo, quando vê a coisa da maneira que é apresentada, pensa que só começaram a medir nos últimos 50 anos. O Al Gore usou no filme a curva do CO2 lá embaixo há 650 mil anos e, agora, decolando. Ridículo, palhaço.

ISTOÉ – Esses temores são cíclicos?
Molion – Eu tenho fotos da capa da Time em 1945 que dizia: “O mundo está fervendo.” Depois, em 1947, as manchetes diziam que estávamos indo para uma nova era glacial. Agora, de novo se fala em aquecimento. Não é que os eventos sejam cíclicos, porque existem muitos fatores que interferem no clima global.

Sem exagero, eu digo que o clima da Terra é resultante de tudo o que ocorre no universo. Se a poeira de uma supernova que explodiu há 15 milhões de anos for densa e passar entre o Sol e a Terra, vai reduzir a entrada de radiação solar no sistema e mudar o clima. Esse ciclo de aquecimento muito provavelmente já terminou em 1998. Existem evidências, por medidas feitas via satélite e por cruzeiros de navio, de que o oceano Pacífico está se aquecendo fora dos trópicos – daí o derretimento das geleiras – e o Pacífico tropical está esfriando, o que significa que estamos entrando numa nova fase fria. Quando esfria é pior para nós.

 
ISTOÉ – Por que é pior?
Molion – Porque quando a atmosfera fica fria ela tem menor capacidade de reter umidade e aí chove menos. Eu gostaria que aquecesse realmente porque, durante o período quente, os totais pluviométricos foram maiores, enquanto de 1946 a 1976 a chuva no Brasil como um todo ficou reduzida.

O aumento de CO2 não é novo. Nos últimos 150 anos, já atingiu 600 ppm. Mas o Al Gore usou a curva do CO2 de 650 mil anos atrás

ISTOÉ – No que isso pode interferir na vida do brasileiro?
Molion – As conseqüências para o Brasil são drásticas. O Sul e o Sudeste devem sofrer uma redução de chuvas da ordem de 10% a 20%, dependendo da região. Mas vai ter invernos em que a freqüência de massas de ar polar vai ser maior, provocando uma freqüência maior de geadas. A Amazônia vai ter uma redução de chuvas e, principalmente, a Amazônia oriental e o sul da Amazônia vão ter uma freqüência maior de seca, como foi a de 2005. O Nordeste vai sofrer redução de chuva. O que mais me preocupa é que, do ponto de vista da agricultura, as regiões sul do Maranhão, leste e sudeste do Pará, Tocantins e Piauí são as que apresentam sinais mais fortes. Essas regiões preocupam porque são a fronteira de expansão da soja brasileira. A precipitação vai reduzir e certamente vai haver redução de produtividade. Infelizmente, para o Brasil é pior do que seria se houvesse o aquecimento.

ISTOÉ – A quem interessaria o discurso do “aquecimento”?
Molion – Quando eu digo que muito provavelmente estamos num processo de resfriamento, eu faço por meio de dados. O IPCC, o nome já diz, é constituído de pessoas que são designadas por seus governos. Os representantes do G-7 não vão aleatoriamente. Vão defender os interesses de seus governos. No momento em que começa uma pressão desse tipo, eu digo que já vi esse filme antes, na época do discurso da destruição da camada de ozônio pelos CFCs, os compostos de clorofluorcarbonos. Os CFCs tinham perdido o direito de patente e haviam se tornado domínio público. Aí inventaram a história de que esses compostos estavam destruindo a camada de ozônio. Começou exatamente com a mesma fórmula de agora. Em 1987, sob liderança da Margaret Thatcher, fizeram uma reunião em Montreal de onde saiu um protocolo que obrigava os países subdesenvolvidos a eliminar os CFCs. O Brasil assinou. Depois, ficamos sabendo que assinou porque foi uma das condições impostas pelo FMI para renovar a dívida externa brasileira. É claro que o interesse por trás disso certamente não é conservacionista.

ISTOÉ – Mas reduzir a emissão de CFCs não foi uma medida importante?
Molion – O Al Gore no filme dele diz “nós resolvemos um problema muito crucial que foi a destruição da camada de ozônio”. Como resolveram, se cientistas da época diziam que a camada de ozônio só se recuperaria depois de 2100?

Na Eco 92, eu disse que se tratava de uma atitude neocolonialista. No colonialismo tradicional se colocam tropas para manter a ordem e o domínio. No neocolonialismo a dominação é pela tecnologia, pela economia e, agora, por um terrorismo climático como é esse aquecimento global. O fato é que agora a indústria, que está na Inglaterra, França, Alemanha, no Canadá, nos Estados Unidos, tem gases substitutos e cobra royalties de propriedade. E ninguém fala mais em problema na camada de ozônio, sendo que, na realidade, a previsão é de que agora em outubro o buraco será um dos maiores da história.

ISTOÉ – O sr. também vê interesses econômicos por trás do diagnóstico do aquecimento global?
Molion – É provável que existam interesses econômicos por detrás disso, uma vez que os países que dominam o IPCC são os mesmos países que já saíram beneficiados lá atrás.

ISTOÉ – Não é teoria conspiratória concluir que há uma tentativa de frear o desenvolvimento dos países emergentes?
Molion – O que eu sei é que não há bases sólidas para afirmar que o homem seja responsável por esse aquecimento que, na minha opinião, já acabou. Em 1798, Thomas Malthus, inglês, defendeu que a população dos países pobres, à medida que crescesse, iria querer um nível de desenvolvimento humano mais adequado e iria concorrer pelos recursos naturais existentes. É possível que a velha teoria malthusiana esteja sendo ressuscitada e sendo imposta através do aquecimento global, porque agora querem que nós reduzamos o nosso consumo de petróleo, enquanto a sociedade americana, sozinha, consome um terço do que é produzido no mundo.

ISTOÉ – Para aceitar a tese do sr., é preciso admitir que há desonestidade dos cientistas que chancelam o diagnóstico do aquecimento global…
Molion – Eu digo que cientistas são honestos, mas hoje tem muito mais dinheiro nas pesquisas sobre clima para quem é favorável ao aquecimento global. Dinheiro que vem dos governos, que arrecadam impostos das indústrias que têm interesse no assunto. Muitos cientistas se prostituem, se vendem para ter os seus projetos aprovados. Dançam a mesma música que o IPCC toca.

ISTOÉ – O sr. se considera prejudicado por defender a linha oposta?
Molion – Na Eco 92, eu debati com o Mario Molina, que foi quem criou a hipótese de que os clorofluorcarbonos estariam destruindo o ozônio. Ele, em 1995, virou prêmio Nobel de Química. E o professor Molion ficou na geladeira. De 1992 a 1997 eu não fui mais convidado para nenhum evento internacional. Eu tinha US$ 50 mil que o Programa das Nações Unidas havia repassado para fazer uma pesquisa na Amazônia e esse dinheiro foi cancelado.

Em 1987, sob Thatcher, países subdesenvolvidos foram obrigados a eliminar os CFCs. Foi uma das condições impostas pelo FMI

ISTOÉ – O cenário que o sr. traça inclui ou exclui o temor de cidades litorâneas serem tomadas pelo aumento do nível dos oceanos?
Molion – Também nesse aspecto, o que o IPCC diz não é verdade. É possível que, com o novo ciclo de resfriamento, o gelo da Groenlândia possa aumentar e pode ser até que haja uma ligeira diminuição do nível do mar.

ISTOÉ – Pela sua tese, seria o começo de uma nova era glacial?
Molion – Como já faz 15 mil anos que a última Era Glacial terminou, e os períodos interglaciais normalmente são de 12 mil anos, é provável que nós já estejamos dentro de uma nova era glacial. Obviamente a temperatura não cai linearmente, mas a tendência de longo prazo certamente é decrescer, o que é mau para o homem. Eu gostaria muito que houvesse realmente um aquecimento global, mas na realidade os dados nos mostram que, infelizmente, estamos caminhando para um resfriamento. Mas não precisa perder o sono, porque vai demorar uns 100 mil anos para chegar à temperatura mínima. E quem sabe, até lá, a gente não encontre as soluções para a humanidade.

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